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Fábio Vieira Figueiredo. Tecnologia do Blogger.

ARTIGOS



Artigo publicado no Portal CONCURSAR editora Saraiva

As gotas de óleo social no direito das obrigações


O direito obrigacional está imbuído de caracteres da justiça social. Preocupa-se com a não-exploração do fraco pelo forte e com a sobreposição dos interesses coletivos que visam a harmonia social em contraposição aos interesses individuais de cunho egoístico.

As transformações no direito obrigacional passam a corrigir situações injustas que foram firmadas quando imperava o liberalismo. Desse modo, o direito obrigacional tenciona privilegiar o conteúdo humano, social e ético, erigindo-se, desta feita, nas bases da socialidade e da moralidade.

É de rogo que se compreenda que a doutrina individualista foi golpeada em seus próprios fundamentos éticos e culturais e ruiu. O devedor passa a ser tratado de maneira bem mais branda e, portanto, humanitária. Além disso, fica atribuída ao vínculo contratual a função social, para alcançar aquelas situações em que seu adimplemento prejudica terceiros.

Assim, tal qual todos os institutos em direito admitidos, do direito das obrigações também se exige submissão a uma função social. Parece-nos claro que a função social do direito obrigacional encontra-se esteada na boa fé dos sujeitos da relação obrigacional, como não poderia deixar de ser.

Com muita freqüência o direito das obrigações é definido como o direito de tráfego ou intercâmbio de bens. É certo que o direito das obrigações trata, substancialmente, do intercâmbio de bens, mas certamente não se resume a isso. Há diversos negócios obrigacionais que não se esgotam com a transmissão de coisas, por exemplo: mandato e sociedade.

Para Karl Larenz, a relação de obrigação é a relação jurídica pela qual, duas ou mais pessoas se obrigam a cumprir e adquirem o direito de exigir determinadas prestações. Desse modo, é sempre formada por pessoas determinadas, das quais uma sempre será credora e a outra, devedora. Além disso, esclarece que toda relação obrigacional vislumbra um fim que é atingir a satisfação do crédito e, desta feita, pode ser tida como um processo que é meio para a consecução de tal fim.

Ressalta que os elementos essenciais da obrigação são o dever de prestação e os deveres de conduta, o crédito como direito à prestação e a possibilidade de sua realização pela via judicial e a garantia do credor pela responsabilidade normalmente conectada à dívida.

Desta forma, vê a obrigação como uma relação jurídica total. Realça que a obrigação compreenderá uma série de deveres de prestação e de conduta e pode ainda conter, para uma ou outra parte, direitos de formação. Sendo assim, é a relação obrigacional um conjunto de conseqüências jurídicas ou de relações e situações que correspondem ao mundo da validade objetiva do ordenamento jurídico.

Mário Júlio de Almeida Costa destaca que a relação obrigacional deve ser analisada como um processo que tende a desembocar na satisfação do crédito; pontua que “parece seguro que a ótica complexa e dinâmica que encara a relação obrigacional como um sistema, organismo ou processo, encadeado e desdobrado em direção ao adimplemento, à satisfação do interesse do credor, possibilita mais rigorosa compreensão anátomo-fisiológica do instituto e de certos dados da fenomenologia jurídica”.

Faz-se mister realçar, ainda, que na estrutura da relação obrigacional não há de emergir apenas o objeto nuclear, mas também deveres anexos, secundários ou laterais, que decorrem da boa-fé e da ótica da benéfica funcionalidade obrigacional que são de enorme importância.

Há, assim, deveres (laterais) que já não interessam diretamente ao cumprimento da prestação ou dos deveres principais ante o exato processamento da relação obrigacional, ou, em outras palavras, à exata satisfação dos interesses globais envolvidos na relação obrigacional complexa, como, por exemplo, o locatário, cujo dever principal de prestação consiste no pagamento da renda ou aluguel, tem ainda, além de outros, o dever lateral de logo avisar o locador sempre que cheguem ao seu conhecimento vícios da coisa, ou saiba que há ameaça, algum perigo ou que terceiros arrogam direitos sobre ela quando o fato seja ignorado pelo locador.

Ora, o fundamento das obrigações não é outro senão a boa-fé ou a fé de um ser humano em outro. Parece seguro, então, que a boa fé é fundamento e limite do direito obrigacional . Stuart Mill, citado por Renan Lotufo, destaca que não há outro fundamento assinalável às obrigações senão as funestas conseqüências de falta de fé de um ser humano em outro. Assim é que o implemento efetivo da boa-fé no direito das obrigações, analisado como um plexo dispositivo dinâmico traduz-se em fundamento e limite de atuação obrigacional funcionalizando este instituto.

Fábio Figueiredo


Artigo publicado no Portal CONCURSAR editora Saraiva
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Direito da personalidade e o respeito à dignidade da pessoa humana


O efetivo reconhecimento dos direitos de personalidade sofreu sérios entraves técnico-jurídicos, vez que se tratam de direitos em que há confusão entre objeto e sujeito.

Após a Segunda Guerra Mundial, diante das agressões causadas pelos governos totalitários à dignidade humana, tomou-se consciência da importância dos direitos da personalidade para o mundo jurídico, resguardando-os na Assembléia Geral da ONU de 1948, na Convenção Européia de 1950 e no Pacto Internacional das Nações Unidas (Diniz, Maria Helena. Curso..., vol I, p. 118). Foi, portanto, com a Declaração Universal dos Direitos Humanos que, de fato, os direitos da personalidade tiveram destaque (LOTUFO. Código civil comentado, p. 48).

Com a aceleração do desenvolvimento tecnológico – pós-guerra – ou seja, com a tensão causada pelo desenvolvimento, o homem passa a reivindicar um espaço seu, ou melhor, um direito que contemple a especificidade de sua personalidade. Isso não ocorre com uma retomada de concepção individualista ou liberal, mas com a exaltação de uma visão personalista e ética de formação e desenvolvimento do ordenamento jurídico (CAPELO DE SOUSA. O direito geral de personalidade).
Os direitos da personalidade tutelam a integridade do ser humano. Há, para análise da proteção da personalidade uma tripartição da personalidade nas respectivas: a) integridade física, compreendendo: vida, alimentos, próprio corpo (vivo ou morto), corpo alheio e partes separadas do corpo; b) integridade intelectual, compreendendo: liberdade de pensamento, autoria científica, literária e artística e, por fim; c) integridade moral, compreendendo: honra, segredo profissional, segredo doméstico, direito de autor, identidade familiar, pessoal e social.

Contudo, este rol de direitos de personalidade é unicamente exemplificativo. Quando o tema é a personalidade humana, em nosso sentir, não cabe falar de taxatividade ou esgotamento de direitos. Não podemos limitar os direitos de personalidade, posto que são o mínimo para que se tenha a existência digna de um ser humano.

Leciona NELSON ROSENVALD que em apressada análise, poderia o intérprete acreditar que o legislador constituinte abraçou a teoria pluralista dos direitos da personalidade com explícita limitação de proteção apenas àqueles valores consagrados como direitos fundamentais. Nenhuma previsão normativa, porém, adquire pretensão exaustiva nessa seara. As exigências do ser humano não serão condicionadas a tipos rígidos, pois elas assumem dignidade superior (ROSENVALD. Dignidade humana e boa-fé no código civil).

A satisfação de tais reivindicações, portanto, não vêm, a nosso ver, pelo aumento do número dos direitos especiais da personalidade, mas pela consagração de um direito geral de personalidade. O que se propugna, portanto, é uma cláusula geral de proteção ao ser humano, ou seja, aos seus direitos mais essenciais. O direito geral de personalidade, sob tal perspectiva, pode ser utilizado para a criação desta cláusula geral de tutela da pessoa, servindo de instrumento adequado para a efetivação do princípio da dignidade humana (GARCIA. O direito geral de personalidade no sistema jurídico brasileiro).

Assim, o direito geral de personalidade encontra, no direito brasileiro, reconhecimento, não só no princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III da CF), mas com muito vigor, ainda, no art. 12 do CC que traça uma tutela geral aos direitos de personalidade. Isto porque a aferição objetiva da tutela geral do art. 12 do CC depende da inserção e conjunção de outros dispositivos de lei (tais como: o solidarismo constitucional do art. 3º, I da CF), que resultarão na subsunção do fato concreto em dispositivo de efetiva proteção da personalidade do indivíduo.

Tal direito geral de personalidade, assim, é consectário lógico e inabalável do direito humano a existência digna. Parece-nos que a proteção da dignidade humana por uma cláusula geral de direitos da personalidade acomoda de maneira mais confortável a finalidade de proteção extrapatrimonial do homem, da sua dignidade.

Consideram-se, como da personalidade, os direitos reconhecidos à pessoa humana tomada em si mesma e em suas projeções na sociedade, previstos no ordenamento jurídico exatamente para a defesa de valores inatos do homem.

Há uma série aberta de relações e os direitos da personalidade não podem ser vistos como taxativos, mas sim de maneira aberta. Além disso, o ser humano tem valor unitário e a cisão feita para o estudo, para fins didáticos da matéria, não prejudica esta unicidade. (PERLINGIERI. La personalità umana nell’ordinamento giuridico).

A aferição dos direitos de personalidade e das medidas para sua tutela, portanto, deve ser feita em cada relação jurídica. Os direitos da personalidade não podem, de maneira alguma, constituir um rol taxativo, pois são direitos que o homem possui, apenas pela sua condição humana.

O ponto de convergência que motiva a presente digressão pode, agora, ser delimitado de maneira um pouco mais confortável.

Ora, avulta, à evidência, que os direitos da personalidade possuem uma intrínseca ligação com o princípio da dignidade da pessoa humana. É de se notar que, em verdade, a temática da dignidade da pessoa humana, donde são extraídos, em observação legal, os direitos de personalidade, possui estreita e profícua ligação com os direitos humanos e com o Estado Democrático.
O valor da pessoa humana é traduzido juridicamente pelo princípio constitucional fundamental da dignidade da pessoa humana, assegurando o mínimo respeito ao ser humano dotado de igual dignidade, sendo esse, como já denotado, inclusive, um princípio explícito dentro de nosso ordenamento.
O princípio fundamental da dignidade da pessoa humana, positivado, funciona como cláusula aberta e respalda, desta feita, o surgimento de novos direitos não expressos na Constituição de 1988, como por exemplo: os direitos humanos, constitucionalizados por via da dignidade da pessoa humana.
Os direitos humanos devem ser considerados como a concretização histórica do princípio da dignidade da pessoa humana, que como dito, encontra-se positivado, hoje, na Constituição Federal.

O elo entre o princípio fundamental da dignidade da pessoa humana, os direitos humanos e os direitos de personalidade é um vínculo inquebrantável.

Por tal motivo, inclusive, mesmo havendo dissonância doutrinária, alguns doutrinadores denotam que os direitos humanos e os direitos de personalidade são os mesmos. Os direitos da personalidade são essenciais à pessoa humana para que se possa estabelecer o tratamento justo e igualitário entre as pessoas. Referidos direitos tutelam a integridade e a dignidade da pessoa humana, desse modo, compreendem a essencialidade do ser, conformando uma noção de mínimo existencial.
Em resumo, pelo valor maior que representam, ou seja: a dignidade da pessoa humana, temos, por inexorável, o elo entre os direitos humanos e os direitos da personalidade.

Fábio Figueiredo
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A patrimonialidade da prestação na obrigação


Uma das mais aventadas discussões no plano do direito obrigacional é a questão da patrimonialidade do objeto prestacional. Maria Helena Diniz destaca que o conteúdo patrimonial da obrigação é imprescindível como componente do elemento objetivo da prestação. Contudo, esclarece que as obrigações morais não se revertem em conteúdo patrimonial direto, ao menos quando o seu descumprimento não gera reflexos de danos que possam ser convertidos em valores econômicos.

Antunes Varela denota que a obrigação não constitui um fim em si mesma. Ela é apenas um meio, um instrumento técnico-jurídico criado por lei ou predisposto pelas partes, para a satisfação de certos interesses; a função consiste na satisfação do interesse concreto do credor, proporcionada através do sacrifício imposto ao devedor pelo vínculo obrigacional.

Varela afirma que o problema da patrimonialidade da prestação é assunto bastante controverso entre os autores. Segundo ele, muitos incluem a patrimonialidade dentre os requisitos de validade da obrigação, mas o fundamento é apenas garantir a sanção ao descumprimento. Contudo, a lei nem sempre estipula sanção, mas compensação de danos causados. Outros defendem que a patrimonialidade é definida pelo interesse do credor (é necessário que o interesse seja patrimonial, suscetível de avaliação econômica, para que haja verdadeira obrigação jurídica). Alguns afirmam, ainda, que o interesse do credor pode não revestir natureza econômica ou patrimonial (ser, por exemplo, de natureza ideal).

Para Varela, nenhum desses argumentos merece acolhida, pois a patrimonialidade não é requisito essencial da obrigação. Segundo ele, o Direito Romano já reconhecia a validade de certos deveres de prestação destinados a satisfazer interesses do credor, sem valor pecuniário, e isso com base nos seguintes fundamentos: a) proteção que merecem alguns deveres de conteúdo não patrimonial estipulados entre as partes; b) função disciplinadora da vida social, que não acaba com os valores de pura expressão econômica.

Ainda segundo Varela, o fato de o direito reconhecer a reparação de danos morais já afasta a patrimonialidade como requisito de validade da obrigação. Não é necessário, assim, que a prestação enriqueça o patrimônio do devedor ou evite seu empobrecimento. As únicas exigências da prestação obrigacional são:

a) que a prestação estipulada corresponda a um interesse real do credor;

b) que esse interesse seja digno de proteção legal. Nesse caso, pretende-se: i) afastar prestações que correspondam a um mero capricho ou a uma simples mania do devedor (ex.: não usar cabelos compridos ou saias acima do joelho etc.); ii) excluir prestações que, embora dignas da consideração de outros complexos normativos (cortesia, moral, religião, usos sociais), não merecem a tutela específica do direito (ex.: reatar relações com outra pessoa, procissões etc.).

A prestação, em resumo, deve ser séria e razoável ao credor e justificar socialmente a intersecção dos meios coercitivos próprios do direito.

Importa realçar, no que se refere ao elemento objetivo prestacional, que entendemos como correto o posicionamento que dispensa a patrimonialidade ou economicidade diretas de tal elemento. Ou seja, basta que a prestação seja um interesse juridicamente apreciável e, portanto, é insignificante que seja passível de apreciação econômica.

Pontes de Miranda explica que já se vai longe o tempo em que as obrigações não atendiam ao interesse somente moral da prestação; em que se dizia que a prestação tinha de ser patrimonial. O que se deve – realça o autor –, pode não ter qualquer valor material, assim, por exemplo, quando “A” obtém de “E” que o acompanhe ao teatro por ser “E” de família respeitável. No caso, o interesse não é patrimonial, pois a prestação não possui valor patrimonial; nem há ilicitude na promessa. Diz-se que a prestação deve ser suscetível de valoração econômica. Se for estabelecida pena convencional, nem por isso se dará valor econômico à prestação: estipulou-se pena para o caso de inadimplemento. No direito brasileiro não há regra jurídica que exija que as prestações prometidas tenham conteúdo patrimonial. Sob esse ponto de vista, não seria necessária a patrimonialidade do objeto para dar azo à conformação da relação obrigacional.

Karl Larenz explica que a prestação pode ser uma ação ou omissão do devedor. Há de ser, de algum modo, vantajosa ao credor. É bem verdade que na maioria dos casos esta dita vantagem reverte-se de maneira patrimonial, contudo, não se trata de exigência à conformação da relação obrigacional que seja efetivamente uma vantagem patrimonial. Para Larenz, nada há de estranho no fato de uma pessoa obrigar outra a fazer uma retratação pública na ausência de interesse patrimonial.

Fábio Figueiredo

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http://www.saraivajur.com.br/concursar/default.aspx?mn=40&c=135&s=



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A patrimonialidade da prestação na obrigação


Uma das mais aventadas discussões no plano do direito obrigacional é a questão da patrimonialidade do objeto prestacional. Maria Helena Diniz destaca que o conteúdo patrimonial da obrigação é imprescindível como componente do elemento objetivo da prestação. Contudo, esclarece que as obrigações morais não se revertem em conteúdo patrimonial direto, ao menos quando o seu descumprimento não gera reflexos de danos que possam ser convertidos em valores econômicos.

Antunes Varela denota que a obrigação não constitui um fim em si mesma. Ela é apenas um meio, um instrumento técnico-jurídico criado por lei ou predisposto pelas partes, para a satisfação de certos interesses; a função consiste na satisfação do interesse concreto do credor, proporcionada através do sacrifício imposto ao devedor pelo vínculo obrigacional.

Varela afirma que o problema da patrimonialidade da prestação é assunto bastante controverso entre os autores. Segundo ele, muitos incluem a patrimonialidade dentre os requisitos de validade da obrigação, mas o fundamento é apenas garantir a sanção ao descumprimento. Contudo, a lei nem sempre estipula sanção, mas compensação de danos causados. Outros defendem que a patrimonialidade é definida pelo interesse do credor (é necessário que o interesse seja patrimonial, suscetível de avaliação econômica, para que haja verdadeira obrigação jurídica). Alguns afirmam, ainda, que o interesse do credor pode não revestir natureza econômica ou patrimonial (ser, por exemplo, de natureza ideal).

Para Varela, nenhum desses argumentos merece acolhida, pois a patrimonialidade não é requisito essencial da obrigação. Segundo ele, o Direito Romano já reconhecia a validade de certos deveres de prestação destinados a satisfazer interesses do credor, sem valor pecuniário, e isso com base nos seguintes fundamentos: a) proteção que merecem alguns deveres de conteúdo não patrimonial estipulados entre as partes; b) função disciplinadora da vida social, que não acaba com os valores de pura expressão econômica.

Ainda segundo Varela, o fato de o direito reconhecer a reparação de danos morais já afasta a patrimonialidade como requisito de validade da obrigação. Não é necessário, assim, que a prestação enriqueça o patrimônio do devedor ou evite seu empobrecimento. As únicas exigências da prestação obrigacional são:

a) que a prestação estipulada corresponda a um interesse real do credor;

b) que esse interesse seja digno de proteção legal. Nesse caso, pretende-se: i) afastar prestações que correspondam a um mero capricho ou a uma simples mania do devedor (ex.: não usar cabelos compridos ou saias acima do joelho etc.); ii) excluir prestações que, embora dignas da consideração de outros complexos normativos (cortesia, moral, religião, usos sociais), não merecem a tutela específica do direito (ex.: reatar relações com outra pessoa, procissões etc.).

A prestação, em resumo, deve ser séria e razoável ao credor e justificar socialmente a intersecção dos meios coercitivos próprios do direito.

Importa realçar, no que se refere ao elemento objetivo prestacional, que entendemos como correto o posicionamento que dispensa a patrimonialidade ou economicidade diretas de tal elemento. Ou seja, basta que a prestação seja um interesse juridicamente apreciável e, portanto, é insignificante que seja passível de apreciação econômica.

Pontes de Miranda explica que já se vai longe o tempo em que as obrigações não atendiam ao interesse somente moral da prestação; em que se dizia que a prestação tinha de ser patrimonial. O que se deve – realça o autor –, pode não ter qualquer valor material, assim, por exemplo, quando “A” obtém de “E” que o acompanhe ao teatro por ser “E” de família respeitável. No caso, o interesse não é patrimonial, pois a prestação não possui valor patrimonial; nem há ilicitude na promessa. Diz-se que a prestação deve ser suscetível de valoração econômica. Se for estabelecida pena convencional, nem por isso se dará valor econômico à prestação: estipulou-se pena para o caso de inadimplemento. No direito brasileiro não há regra jurídica que exija que as prestações prometidas tenham conteúdo patrimonial. Sob esse ponto de vista, não seria necessária a patrimonialidade do objeto para dar azo à conformação da relação obrigacional.

Karl Larenz explica que a prestação pode ser uma ação ou omissão do devedor. Há de ser, de algum modo, vantajosa ao credor. É bem verdade que na maioria dos casos esta dita vantagem reverte-se de maneira patrimonial, contudo, não se trata de exigência à conformação da relação obrigacional que seja efetivamente uma vantagem patrimonial. Para Larenz, nada há de estranho no fato de uma pessoa obrigar outra a fazer uma retratação pública na ausência de interesse patrimonial.


Fábio Figueiredo
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Nota sobre a função social do contrato


Conforme assinala Roberto Ruggiero, se era nítida a distinção entre o contrato, o pacto e a convenção no direito romano, na terminologia moderna, qualquer distinção entre estes institutos é tênue e descolorida. Tais expressões, hodiernamente, são empregadas como sinônimas, malgrado a praxe de designar os contratos acessórios de pactos (pacto comissório, pacto antenupcial etc.). A ideia de um contrato com predominância da autonomia da vontade, em que as partes discutem livremente as suas condições em situação de igualdade, deve-se aos conceitos traçados para o contrato nos códigos francês e alemão.

O art. 421 do CC dispõe que a liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato. Devem-se analisar, para a função social do contrato, minimamente, dois aspectos. A função social pode ser vista como princípio entre as partes e, neste caso, visa espancar a possibilidade de uma contratação injusta, ou seja, a relação contratual deverá ser equilibrada entre as partes (função social intrínseca) para que se evite que um dos contratantes venha a submeter o outro, até mesmo porque, na moderna tônica da relação contratual, há que falar em cooperação entre os contratantes e não submissão.

Por outro lado, a função social pode ser analisada sob o ponto de vista da sociedade e, neste caso, devemos atentar para o fato de que o contrato não poderá, ainda que justo e equilibrado entre as partes, prejudicar a coletividade (função social extrínseca). Este preceito deve ser entendido sob dois aspectos: a) o contrato bilateral deve encerrar trocas úteis e justas (Ver: Enunciado 22: “Art. 421. A função social do contrato, prevista no art. 421 do novo Código Civil, constitui cláusula geral, que reforça o princípio de conservação do contrato, assegurando trocas úteis e justas” – Aprovado na I Jornada de Direito Civil da CJF); b) minimização do princípio da relatividade contratual (função social extrínseca) (Ver Enunciado 21: “Art. 421. A função social do contrato, prevista no art. 421 do novo Código Civil, constitui cláusula geral, a impor a revisão do princípio da relatividade dos efeitos do contrato em relação a terceiros, implicando a tutela externa do crédito”. E, ainda: “23: Art. 421. A função social do contrato, prevista no art. 421 do novo Código Civil, não elimina o princípio da autonomia contratual, mas atenua ou reduz o alcance desse princípio quando presentes interesses metaindividuais ou interesse individual relativo à dignidade da pessoa humana – Enunciados aprovados na I Jornada de Direito Civil da CJF).

É correto afirmar que o sistema jurídico brasileiro agasalhou a relação jurídica contratual como um instrumento de transmissão de direitos e relações jurídicas, devendo o contrato atender a uma função social, o que denota uma mudança de rumo nas relações contratuais , visto que até 2002, vigente o Código Civil de 1916, o contrato, no Brasil, assentava suas raízes no chamado estado liberal, tendo relevância a igualdade formal entre as partes envolvidas. A partir de 2003, vigente o atual Código Civil, a relação contratual tem como base o estado social, a igualdade material, o solidarismo, a dignidade humana e os direitos de personalidade, devendo, como já dito, atender a uma função social.


Fábio Figueiredo

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Autonomia privada e concorrência

A formação de truste, sem dúvida é figura emblemática de colisão de direitos fundamentais. Nessa seara teremos, então, o confronto entre a autonomia privada e a intervenção estatal.

Os conflitos entre normas fundamentais são fenômenos de complexa solução, ainda mais se tivermos em conta o nível de detalhamento contemplado no Texto Constitucional. Diante de tais antinomias, teremos choques resolvíveis segundo critérios mais ou menos definidos em regras de hermenêutica como a consunção, a especialidade, a alternatividade, a subsidiariedade, a anterioridade, a hierarquia, etc.

Algumas dessas formas de solução de antinomias não são facilmente aplicáveis na hipótese de colisão de direitos assegurados pela Constituição, tendo em vista que, de uma só vez, se vêem afastados os critérios da especialidade, alternatividade, subsidiariedade, anterioridade e hierarquia, porque no problema posto, os princípios albergadores de tais direitos têm o mesmo nascedouro, o mesmo status constitucional Lotufo Renan, (coord.). “Cadernos de Direito Civil Constitucional“, Curitiba, Ed. Juruá, 2001, Artigo: “Das concentrações entre agentes econômicos: a regulamentação normativa feita pela Lei antitruste brasileira (Lei: 8.884/94 e a autonomia Privada”, Ercias Rodrigues de Sousa).– (Fichamento).


No que concerne à colisão entre princípios, tal não importará no singelo afastamento do princípio, dada sua extensão e hierarquia, mas sim, o que se deve fazer é afastar o campo de tensão entre eles, de modo a que se possa, naquela circunstância específica, concluir-se pelo maior prestígio de um deles com a conseqüente diminuição do outro.

A primeira lei antitruste americana data de 1890 e proíbe contratos, combinações em forma de truste ou de outro tipo, ou conspirações para restringir o comércio e, ainda, veda as tentativas de monopolização de mercados, por iniciativa individual ou combinada, autorizando no entanto, os monopólios, sempre que alcançados por meios normais oriundos de superioridade natural gerada por maior competitividade, em dispositivo semelhante ao que se tem no artigo 20, § 1o da Lei Antitruste Brasileira.

Ainda em 1914 foram proibidas práticas como a de vendas casadas, acordo de exclusividade, se prejudiciais à concorrência, e as fusões, nas mesmas condições e que da estrutura de defesa da concorrência como um fim em si mesmo, obteve-se uma evolução para o que poderíamos denominar de concorrência instrumental, presentemente posta em prática no Mercado Comum Europeu, como forma de proteção daquele Mercado contra grupos econômicos, estrangeiros, notadamente americanos e asiáticos.

O desenvolvimento histórico da concorrência no Brasil nos remonta ao Brasil-colônia, de impedimento ao exercício de atividades manufatureiras. Já após a vinda da Família Real para o Brasil, foram implantadas algumas importantes medidas de fomento de atividades econômicas na Colônia, tais como: a criação de bancos, a abertura dos portos às nações amigas e a instituição da liberdade de manufatura e indústria e, após a independência o desenvolvimento econômico foi impedido por graves crises político-sociais. Mas, somente com a Constituição de 1934 e legislações infra-constitucionais que se seguiram que surgiu de modo expresso, a liberdade econômica no Brasil (artigo 115 da Constituição citada).

Com algumas variações, as próximas Constituições asseguraram a liberdade econômica e condenaram o abuso do exercício desse direito e com o advento da atual lei antitruste, o país passou a dar tratamento ao regime da livre iniciativa e da defesa da concorrência, em nível igualável aos melhores ordenamentos jurídicos existentes, como os do Mercado Comum Europeu e dos Estados Unidos.

A tratativa constitucional da concorrência e da livre iniciativa são princípios, axiomas econômicos. A Constituição Federal de 1988 inaugurou uma sociedade pluralista. Impõe-se aceitar a possibilidade de entrechoques no relacionamento social, ocasionados exatamente pela liberdade com que se movimentam os partícipes desse pacto.

É preciso que se tenha em mira que a liberdade comparece como valor transcendental já no preâmbulo do texto maior, encontrando guarida em diversos pontos da Constituição Federal, que prescreve a livre iniciativa como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil. Tais preceitos são vetores de interpretação, necessários à construção do sentido e alcance do Texto Magno.

O constituinte assentou como basilares à ordem econômica, os valores inerentes à livre iniciativa e à livre concorrência, dentre outros. Liberdade, posta dessa maneira, encontra aplicação na livre fluência das denominadas regras de mercado.

Ora, o direito à liberdade tem muitas faces, mas, no entanto, seja qual for a saturação semântica que se venha a dar ao termo, ficará sempre um substrato: a liberdade é valor necessário ao indivíduo.

O já reconhecido conflito social entre a liberdade e o intervencionismo é realidade presente no confronto entre a autonomia privada e os direitos resguardados pelo direito de concorrência, notadamente a proteção da livre iniciativa, dos direitos do consumidor, do meio-ambiente, em suas diversas manifestações, e, ainda, da repressão ao abuso do poder econômico.

É necessário entender que sendo a liberdade um valor fundante e estruturante da sociedade capitalista, deve ser natural a autonomia privada dos entes econômicos, com vistas a alcançar o melhor desempenho - lucro - com o menor esforço em termos de fatores geradores desses excedentes e ressalta a naturalidade, em um sistema jurídico assim, a livre disposição dos entes produtivos privados, em movimentos de concentração e dispersão constantes, conforme seja mais vantajosa uma ou outra política de atuação. No que não se pode crer é na prática desleal de imposição interesseira, que só gera danos aos mutuários.

Normas antitruste e sua aplicação devem atuar em conjunto com a evolução da autonomia privada. Não se pode simplesmente “deixar o jogo correr”. É a regulação referida por tais regras que denota a política publica de um País em determinada zona de conflito e atrai ou dispersa investimentos.

A atuação irresponsável nestes domínios faz brotar insegurança jurídica não só para os mutuários, mas à toda a coletividade, o que denota contratos firmados com esteio em atos normativos desprovidos de impessoalidade e que atacam a moralidade que deve seguir no trato administrativo. Sem sombra de dúvidas, nessas situações deparamo-nos com circunstâncias em que o potencial lesivo da contratação à toda coletividade é tamanho que resta maculada a função social extrínseca de referidas contratações.

A preservação da autonomia privada é o motor da atividade econômica capitalista e da preservação de direitos difusos e coletivos os quais poderiam se ver atingidos pela exacerbação ou limitação irresponsável do exercício dessa autonomia privada.

É clara a acolhida constitucional à livre iniciativa, como direito coadjuvante à proteção constitucional da propriedade e que, em ambos os casos, tem-se a conclusão da proteção da autonomia privada. Da mesma maneira é clara, na Constituição, a proteção da livre concorrência, dos direitos do consumidor, do meio ambiente ecologicamente equilibrado, e de outros interesses difusos e coletivos.

Da confluência de direitos assim aparentemente antagônicos, deve seguir-se necessária a aplicação do princípio da proporcionalidade, segundo o qual, os direitos, por mais caros, não comportam o grau absoluto, dada a necessidade de resguardar a igual fruição por todos os que estiverem em idêntica posição, do bem jurídico contemplado na norma. Por lógico que é a conclusão de ser constitucional a imposição de limitações às concentrações entre agentes econômicos e do regramento quanto aos contratos, sob qualquer forma levados a efeito, com vistas à proteção de ambos os quadrantes : o máximo de autonomia privada possível, com o menor risco à concorrência e aos direitos difusos e coletivos ameaçados pelo domínio de mercado relevante de bens e serviços.

Fábio Vieira Figueiredo. Advogado. Doutorando e Mestre em Direito Civil comparado pela PUCSP. Pós - graduado em direito Empresarial e Contratual. Professor e coordenador do Núcleo de Prática e Pesquisa jurídica da Universidade Municipal de São Caetano do Sul - USCS, da Universidade São Judas Tadeu - USJT e da Faculdade Professor Damásio de Jesus - FDDJ. Professor e coordenador pedagógico dos cursos preparatórios para concursos do complexo Jurídico Damásio de Jesus. Autor e coordenador de coleções da editora Saraiva.

Fábio Figueiredo

Artigo publicado no Portal CONCURSAR editora Saraiva
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Autonomia privada de contratação


O homem que antes se encontrava em Estado de Natureza, vê a necessidade de uma ordenação. Primeiro ele passa a ser pré-ordenado, quer seja pelo divino, quer seja pelo império, depois ele chega em uma fórmula para a auto-ordenação.

O indivíduo faz, então, a cessão de uma parcela de sua liberdade natural e obtém, desse modo, liberdade jurídica. Essa liberdade jurídica da qual tratamos deve buscar o maior conteúdo de socialidade possível. No entanto deve, também, resguardar certa parcela de individualismo para que se conceba a autonomia privada.

Chegamos neste ponto depois de termos entrado nesta era de despatrimonialização do direito privado. É a busca pela socialidade, acima de tudo, a busca pelo perfeito equacionamento entre o individual e o social. Com propriedade assevera a MARIA HELENA DINIZ que não há lei que não contenha uma finalidade social e é a sua perseguição que pode trazer a felicidade à sociedade política.

O contrato, como um dos meios de formação de negócios jurídicos, talvez o mais importante deles, está adstrito a regras objetivas que lhe dão ares de socialidade.

Sempre deverá ser respeitada a existencialidade que é trazida à luz pelos princípios constitucionais da igualdade, solidariedade e dignidade da pessoa humana.

Ora, devemos, asseverar que isto não significa, de maneira alguma, o fim da segurança jurídica, o banalismo da revisão contratual ou fim do “pacta sunt servanda”. Significa sim, o reflexo da mudança do conceito de igualdade e, mais precisamente, de liberdade de contratar. No perfeito equacionamento entre o individual e o social, a relação de sujeição não deve existir. Deve ser garantido um tratamento igualitário ou, pelo menos, digno.

Há, dessa forma, alguns elementos ditos públicos que se instalam no direito privado, mais precisamente na autonomia da vontade para reger de forma meta complementar as atuações dos contratantes já na fase de negociações preliminares.

Contudo, como bem preleciona EMÍLIO BETTI as atividades sociais do Estado Social não aniquilaram, de maneira alguma, a autonomia da vontade, o que ocorre é a limitação de seu exercício dentro da equação entre bem individual e bem comum.

Para ANA PRATA, o conceito de autonomia privada tem estreita ligação com os conceitos de sujeito de direito e direito de propriedade. Entende que no momento em que a pessoa passa a ser sujeito de direitos e deveres e, por via de conseqüência, passa a poder dispor de seus bens, ela é titular de um poder de efetivação de negócios jurídicos. Portanto, entende a autonomia privada como liberdade negocial patrimonial da pessoa capaz, que tem como limite externo o direito objetivo.

ENZO ROPPO aproxima-se muito da visão da autora portuguesa Ana Prata, na medida em que entende a autonomia, sempre, em função de uma operação econômica que, aliás, é elemento ínsito e indispensável.

Bem mais amplo, é o conceito trazido por PIETRO PERLINGIERI que entende como autonomia privada o poder concedido pelo ordenamento a um indivíduo ou determinado grupo de indivíduos de determinar vicissitudes jurídicas em conseqüência de comportamentos, em qualquer medida, livremente assumidos.

Denota, ainda, LUIGI FERRI que a autonomia privada é direito objetivo. Faz parte da dinâmica do direito, ela cria novas normas e, portanto, é direito objetivo, já o direito subjetivo, faz parte da estática do direito.

A forma de exercício da autonomia privada, como bem lembra GIOVANNI ETTORE NANNI é o negócio jurídico. Portanto, a autonomia privada é o poder criador de uma norma que dispõe de matéria privada e o negócio jurídico é a norma.

Importante observar, dessa guisa, que a autonomia privada indica a licitude de se estabelecer negócio jurídico, com os limites objetivos traçados pelo ordenamento, pela ordem pública, pela moral e pelos bons costumes.

Sendo assim, a liberdade de contratar conta hoje com limites definidos que, em nosso sentir, não permitem mais atribuirmos a denominação livre de voluntarismo contratual, donde nos parece razoável anotar como autonomia privada de contratação esta esfera de potestade em que o particular se encontra e pode exercer seus atos volitivos a entabular normas individuais privadas.

Fábio Figueiredo

Artigo publicado no Portal CONCURSAR editora Saraiva
http://www.saraivajur.com.br/concursar/default.aspx?mn=40&c=104&s=


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